Te mando este pedaço de cidade, aqui não tem muita paisagem.
Sendo assim, espero que goste.
Do seu primo,
segunda-feira, agosto 24
mate leão
descalça o rosto sem alarde
não percebe o avanço sorrateiro do inimigo
mergulha sem que o olhar impeça
o jogo que clama o dentro do aberto
derramando o chá das cinco
no pontapé da tua ferida
não percebe o avanço sorrateiro do inimigo
mergulha sem que o olhar impeça
o jogo que clama o dentro do aberto
derramando o chá das cinco
no pontapé da tua ferida
quinta-feira, agosto 20
rastro
essa é pra você
que tanto olha
e se interroga
pra que serve tudo isso
se o nada é a única coisa
que se guarda
que tanto olha
e se interroga
pra que serve tudo isso
se o nada é a única coisa
que se guarda
an ordinary postcard
Recife, 28.02.78
Querido Paulinho,
só saudades,
recebi sua carta. Ainda não respondi por falta de tempo, mas breve o farei.
Enviei um cartão para Machado. Você sabe dizer se ele respondeu e recebeu?
Bem, mas este postalzinho é só para você saber que continuo me lembrando de você.
Quando você vai aparecer por aqui?
Do seu,
Querido Paulinho,
só saudades,
recebi sua carta. Ainda não respondi por falta de tempo, mas breve o farei.
Enviei um cartão para Machado. Você sabe dizer se ele respondeu e recebeu?
Bem, mas este postalzinho é só para você saber que continuo me lembrando de você.
Quando você vai aparecer por aqui?
Do seu,
quarta-feira, agosto 19
esporro
o pai toca o filho no úmido meio
de sua pele imaculada
e procria desejo na prole
inútil
que olha o gozo
do filho do avô
tocado no úmido meio
de sua pele maculada
na trava da língua
de sua pele imaculada
e procria desejo na prole
inútil
que olha o gozo
do filho do avô
tocado no úmido meio
de sua pele maculada
na trava da língua
R.S.V.P.
tem dias que ele sente uma solidão medonha: papo de bicho papão com a carochinha de que estar só é bom, de que a solidão é opção, coisa que não tem fuga e jeito de se lidar. preposição que se adianta e se posiciona no meio da fala. por que tanto coração na tua letra?
segunda-feira, agosto 10
sexta-feira, agosto 7
obras completas
sente saudade dos teus verdes encantos, interrogativos e pendentes no ar. bolero das antigas que só você sabe os passos muy bien. mas por que fica dançando a contrapelo enquanto a carne se envergonha de dizer que adora o melhor do lobo no homem?
obras completas II
é só chafurdar a sua biblioteca - o cheiro amarelado da herança dos dias, os livros não lidos, aqueles que foram assinados e jamais mencionados nas conversas, alguns que sequer saíram dos envelopes de papel, as pastas rosas de fotocópias, os cartões postais do mercado de pulgas, telefones dos amantes na última folha e que perderam o rosto do nome, dedicatórias formais e manchas de vinho na lombada, a enciclopédia do pai, receitas da mãe e revistas capricho.
tua estante é uma pose.
tua estante é uma pose.
quinta-feira, agosto 6
fim de semana
esperar cansa, e causa uma dor maior ainda. você se coloca em posição de controle, se segura pra não ter um troço, mas o sangue fica a mil por hora e corre demais, a vida fica um pancadão. não tem banho de cheiro, não tem coqueiro e água fresca. tudo sai aos borbotões lá dentro, mas coloque uma represa, aprenda fazer muito barulho pra não ser pouco por nada. às vezes vem um cansaço. e um respiro. rouco.
sábado, agosto 1
la mancha blanca
jamais saberá como seria se tivesse nascido aqui. nunca pertencerá totalmente aqui, e onde nasceu não te quer mais. na realidade, nunca te quis -- é a mãe empurrando para o mundo um filho que busca a outra em casa postiça, e com quem finge brincar de experiência. não pertence a lugar nenhum, vive lá e cá, finge escolher, finge opções nas terras que são liberdades em você. o ledo engano da bolinha de pingue-pongue.
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