terça-feira, junho 29

miniatura

é isso que dá a falta de um beijo raptado:
me faço réptil.

O espera

falta pouco
são números
coisa à toa
em conta
gotas
chegará logo
mais dia
menos noite
(desfia tudo
e recomeça)

el dia de la sangre

as horas milongam
e você no contra
deste passo double
revendo avessos
costurando versões
enquanto as tuas pernas
-- posturas e lisuras --
arrematam gingas
noutro lado da esquina

quarta-feira, junho 23

primeiro capítulo

tem que separar tudo, cortar rápido as passagens que levantam bandeira, deixar tudo quietinho pra não escorregar, pra não puxar o tapete, pra não dizer não quando deve, entregar os créditos sem retorno e sabendo que ficará tudo no negativo: um berro te quiero y basta.

quinta-feira, junho 17

duas horas

a garra no fundo dos olhos
um sabor de fruta ferida
vermelho pipocando
o brilhoso das meninas
enquanto escorre meloso
sad sweet people
na rádio do mundo ao lado

mas
faltam os fotos
e aquela velha
sim a queda
calada canção

uma hora

no fundo do olho
um sabor de fruta ferida
vermelho pipocando
no brilhoso das meninas

enquanto madruga
sad sweet people
no rádio do mundo ao lado
as palavras sem frutos
terminam sem mentes

faltam as fotos
e aquela velha
sim a queda
calada canção

terça-feira, junho 15

débito ou crédito?

Só tem os livros e nada mais que possa chamar de seu: corrente quebrada, nem terreno alugado. Às vezes se pergunta por que tanta letra, tantas páginas, tanta tinta gasta sobre a cabeça dolorida. Responde que o melhor seria queimar, parir outra leitura e sorrir uma culposa felicidade. Mas as coisas demoram a pegar fogo.

segunda-feira, junho 14

alarme

As horas que aqui aparecem estão erradas, vivem enganando o que a princípio é meio, mas quando se começa é inevitável a distância do ponto de partida, os olhos ficarão nuvens turvas sobre o céu da memória, perderão a importância primeira que mantinha acesa aquela luz cativa do lado de dentro. As horas que aqui aparecem estão erradas.

daqui por diante

quando se via do alto
a água em pleno azul
um gosto ardido quente
do amarelo sobre papel
pés que sobem e descem
esquinas suadas noturnas
minutos em sopro suave
sobre rosto que era dois
aquele dia que ainda
se pensava em outro dia
que sereia pra voltar
que era um penúltimo
daqui a pouco um até
do canto de um encanto
que não volta não volta
e revolta o cartão postal
rasurado um dia rasgado
antes que salve toda dor
desta capital primeira
em longo deslembrar

domingo, junho 13

1973

correr com os lobos
um beijo do vento
sobre o pelo
dos acontecimentos
-- já tentou duas vezes
mas lá vem
o cio desembestado
bufando baforando
chifrando murros
na faca da ponta

tem um búfalo
dentro de ti.

sábado, junho 12

volume 2

olha,
você tem todas essas coisas e diz que desafino na letra
ok, você venceu: só roubo por amor

(e devoro)

pra te rever melhor

recado amarelo

Fica abafado, um tapa oco no ar, nem som das cinzas: só lhe resta soletrar o surdo pingo das palavras. Só. E soçobra.

passagem

mesmo que agora um escorrer quase nada, azul sem blues, nome na mucosa da boca, ainda assim continua teu amor (perigoso)

quinta-feira, junho 10

de repente

não perca tempo
não tem voz alta
é torto caducado
pernas capengas

antes fosse choro
um ronco baixinho
depois de exposto
os plenos pulmões

respira essa letra
sob silêncio fundo
até escorrer água
no canto da testa

ritmo

ok, deixemos o ouro de lado: este pulso é o teu melhor.

terça-feira, junho 8

senhoras e senhores

Ele só gira em torno de você, não consegue se livrar destes olhos, pede tua atenção fingindo liberdade, amarra-se entre seus dedos a cada visita para que conduza os fios com destreza e malabares. Deixa cair as bolas, berra a quatro ventos, prende teus ouvidos e confessa que aqui não dá. Aqui não.

lista do mês

assim:
os olhos de Rufus Wainright
a voz de Lou Rhodes
riscos de Basquiat
amaciante na roupa de cama
então:
o quarto
a lavanderia
os carros pela janela da cozinha
verde que se vê da varanda
o sorriso da foto perto do telefone
para o sabão do lava louças
que inunda:
um poema desajeitado
em passadas coxas
desmaiadas lembranças
entre a sua candura

segunda-feira, junho 7

hoje, uma senha

alguns dias são ruídos, palavras poucas e desencaixadas, cabeças na forca bamba, o fim das horas no singular. ele te irrita com tantas perguntas, ele sabe e você não. que ao teu lado as coisas se tornam crianças.

sexto verbal

não consegue salvar abraçar meditar premeditar recolher colher com uma colher todo o sumo de uma ausência

que sangra

torção

Está assim: abraçando ursos, fritando de um lado ao outro, acordando sem o bom dia da canção. Lá vem o café de sempre, sem a colheirada doce de antes, engolindo em seco o requentado pão de uma pobre rima, a máxima do dia.
Nada se afaga diante de você.

domingo, junho 6

Nährwerte

milchschokolade, baby
só enrolar ponta de língua
arranhar fundo em garganta
descendo sonoro doce
encanto branco
de teu nome

sexta-feira, junho 4

régia

ai
esse risco de sombra é um risco

fingere

ainda costura alguns fiapos para que não se esfarrape no correr do dia, ainda procura uns retalhos baratos para que não encalhe o morrer da vida, ainda sutura os baralhos jogados, pára diante da tua imagem e sucumbe joga mascara mente trai os pensamentos e entrega o que te pertence e que você nem mesmo sabe e junta.
tudo que é teu.

junkiebox

sophie mata a fome dos ouvidos
phillip morre entre as cinzas
mas nada nada nada nada
aniquila retira maltrata
este desejo que trago
(fumaça de só gole
ânsia da escuta
do teu você)

quarta-feira, junho 2

a lâmpada

três palavras
que definam
e definhem
a montanha russa
este fim
esta sobra tua
que atua
sobre mim:

terça-feira, junho 1

31 Tages

as tuas roupas
pele na terra de Hermes
a fumaça da cigarra
cabeça sem pelos
coração na hora exata
badcrema queima todo o mal
ein kuss depois das seis
(repete tudo umas três vezes
e suspira)

junho

Demorou tanto a reaparecer que se tornou uma surpresa rever o coelhinho brincando no quintal de livros. Relembrou o abril ralentado, uma demora escancarada e reles ao teu chão. Não há indício do remissivo e nem páginas arrancadas neste aberto: somente letra roendo letra, roeduras na pele macia da saudade que se come com a ranhura dos olhos.
Com casca e tudo.