segunda-feira, dezembro 28

kamikaze

esta palavra
tua malvada
esta carne
mal lavada
dá na cara
a queda
desta letra

inner landscape

Salvador Jundiaí Fortaleza
Paraíba Pompeia Uberlândia

Rio a dor
e o nome

janeiro fevereiro

contagem regressiva:
cama grande
coração arrumado
onde cabem tantos desejos

a cor verde de tuas meninas
cílios alongando castanhos
um cerrado sorriso
e a carícia de uma voz felina

cada você cada um

domingo, dezembro 27

cocktail

dormindo assim
meu pequeno inocente
tudo fica fácil
sem peso nem despedida
o último aceno
de um final perfeito

terça-feira, dezembro 22

flyer

toda essa música
young hearts correndo solto
enquanto a gente se joga
nesta vida disco
kitsch zona sul
espelhos na retina
de um mundo copacabana

domingo, dezembro 20

RE:

antes fosse um pedido
sem dramas e cafeína

molhando meus lábios

sábado, dezembro 19

ego

Às vezes um golpe baixo, delito pequeno pra ter mais perto.
Quer uma massagem?

velvet

Melhor esquecer o tempo perene da última mirada: investida com retorno vacilante, cúmplices deste passeio d'olhos que nunca avança, tapar ouvidos enquanto outros conversam pra ter a tua voz do outro lado da mesa, entrar no táxi, virar para trás e ver que não me perde de vista. Querendo empurrar a minha proteção pela tua goela, sacudir você todo, devorar os pelos que te restam no peito ainda desconhecido.
Pra que tanto cílios neste medo, baby?

quinta-feira, dezembro 17

goma

um chocolate gelado
teus olhos sambando
enquanto escuta
teus olhos grudados
enquanto se fala
olhos que parecem
de alguém
fantasma presente
que ainda é desejo

terça-feira, dezembro 15

zero

vou te contar
os olhos já não podem
com este alvo esfacelado
mais um rosto de perfil
claro raro nada barato
tua história perde linha
pede fios e despedidas
mesmo que beije a rima
da tua boca pouca
e rouca

segunda-feira, dezembro 14

apto 107

é bom escrever olhando o céu, com a escrivaninha apontada para o azul, ver a menina de rosa sobre a moto, prédios a 70 km ladeira abaixo, vida encaixotada em arranques metálicos,
um geral absoluto,
e contar com a surpresa dos passarinhos.

sábado, dezembro 12

hóspede

bem vindo ao deserto, mesmo que não esteja no caminho errado. agora é hora de sair nú sem passaportes e garantias. você não precisa ser uma plateia de meia entrada. aqui tudo é free, terreno absorvente de tantas intimidades. pode desempenar fuxicos, deitar neste chão de terra batida, água na moringa e cafuné de despedida.
l'événement é puro envenenamento, baby: joga, rasga, pulula e guincha.
o teu nome.

avós dele

das dores que te fez maria
do amparo que te fez maria
do socorro que te fez maria
da consolação que te fez maria
auxiliadora que te fez maria
maria que te fez josé
maria que te fez joão
alices carmos rosários lourdes
helenas estelas pias eulálias
voz que te fez
alcídia

quinta-feira, dezembro 10

miniatura

tem um oco antes que você diga
pisca pisca em árvore de natal
uma esfiha de queijo outra de espinafre
debaixo dessa chuva tardinha
enxovalha a palavra até o torcicolo
o que se fala e o que se paga
antes que você diga
tem um pouco de ternura

quarta-feira, dezembro 9

não esquecer:

um tylenol, um banho morno com odor de rosas, chocolate quente, livro nunca aberto, fechar os olhos por alguns instantes, aquela música, limpar o arquivo morto, um jeans novo, recado na secretária do joão, roupas colocadas de molho, a mão no rabo do cachorro, a vitrola tocando não este blues este blues não agora não

terça-feira, dezembro 8

presto

acorda e escuta
cdj do pizzicato five
ao vivo pra tocar
a vida sem parar
na tua

domingo, dezembro 6

a própria idade

dessa vez não rabiscou sobre o livro
guardou as cursivas e deixou saltar
caixas altas caixas pequenas caixas
sobre o branco papel quadriculado
peneirando as capelas terra batida
café pão chouriço cão pastor alemão
bodas ouro galo milho vaca cavalo
peneirar a cabeça peneirar a vida
cada feito refinado em fim feito fubá

...

parece que sente a fumaça antes mesmo do sinal
fica ali como quem não quer nada esperando a chamada
telefone fax video online caixa de correios telemensagens
com toda sinceridade responde se gostas

sexta-feira, dezembro 4

Note bem:

reler o que se escreve pode ser estranho. coisas guardadas na gaveta saltam bolor, um cheiro de agora. parecem de outra pessoa, parecem você. podem ter a mesma grafia mas estão em uma língua morta. precisa beijar pra voltar a entender. fechaduras são datas engessadas, sem tradução literal do que se lê, por favor: um pouco mais de dignidade ao renascer das tintas.

2 novas mensagens

sim ele sabe muito bem
estar ali e fingir de morto
ei tudo ok e sair de banda
pra ver a noite passar
provocar e crer que dói
pra ter a sua resposta

sim, está.

cuidado, rapaz
são unhas redondas
olhos de lince
boca com carne

um dia te morde
e depois assopra
teu nome
nunca mais

à vista

por que tão blasé?
tira esse blazer
essa cara de mistério
tome outro drink
pra que você brinque
de cara lavada
sem excitações
nem citas
e seja

quinta-feira, dezembro 3

décimo primeiro

tantos poetas se jogam
tantos poetas se montam
tantos poetas se criam
tantos poetas se escondem
tantos poetas ameaçam
tantos poetas choram
e não fazem
moi

correspondance

desejos tão pequenos
liquidação total
pague um leve cinco
quem dá mais?

quarta-feira, dezembro 2

envelope blue

mais uma manhã doce
acordando às dez
olhar o espelho espelho teu
perguntando sempre
a travessura do dia:
renúncia ou resistência

terça-feira, dezembro 1

expresso

mais um dia
um café um suspiro
com toda a força

segunda-feira, novembro 30

morse

por que não fura a tela e rouba os meus desejos?

tom tongue

it's hot today
a glass of wine
foreign affairs
explicit lyrics
and soundtracks
a sunny feeling
blues goes fast
cause you dance
a little bit closer

sábado, novembro 28

hide and seek

ele quer que você aqueça tudo o mais, mesmo que o ceú caia sobre a sua minissaia, só quer que você tire da cartola
aquela palavra.

quinta-feira, novembro 26

un bolero

por que escrever sobre o amor? por que não outro tema? por que não vira o disco? por que não se entrega sem ternura? por que buscar tanto querer? por que se rasga tanto nestas letras? por que não se distancia?

por que te dar tanta vida?

uma companhia

quando dois bicos não se beijam
um olho diz merda ao outro
a lebre caça pelo cão
que final terá nossa fábula?

a rosa mais linda que houver

de uns dias pra cá, ele tem escutado muito Chavela Vargas e seu tecladinho, deixado seu sangue derramar sobre a vereda tropical, derretendo no calor e nos abanicos de palmeiras
pra ficar um pouco mais, un chiquitito más
com esta infelicidade
tua

old school

volta vem
viver outra vez
este filme demodé
ser trem e coração
na brilhantina do tempo
(pega, rapaz)

quarta-feira, novembro 18

ethos

feito papel carbono
rasbicando mesquinho
perguntas e perguntas
na tua cara de barba feita
pra te ver roçar
com ódio e desejo
esta cabeça tronco
e membros da tua vingança
teu escravo seu escarro

segunda-feira, novembro 16

projétil

Olhar pra você não é propriamente ter um espelho, mas o reconhecimento de um tempo onde havia algumas esperanças e nenhuma certeza, uns pequenos fracassos a cada passo, as malas prontas para a fuga, um sorriso que hoje não se estampa, as esquinas de sábado no corujinha, pernas bambas pra que te quero, pois tem os cabelos que me faltam.
Teu retrato, meu teatro.

sexta-feira, novembro 13

out of fashion

não tem ninguém por aqui
não há nada que devolva
neste espaço em branco
você

sábado, novembro 7

bate e volta

coração vem cá
fazer cafuné
em um naco de pedra
meu coração

sexta-feira, novembro 6

R.S.V.P.

tudo quente mas nada degela
ao menos uma gota de sangue
ou uma sobrevida um pulsar
que não se rasga nem se apaga
do outro lado da tela

surpresa

atende e reconheço
estava ali desde antes
ressoando no ouvido
o jardim das tuas delícias
através de grades grossas
dourado brilho em portão
que impede de avançar
bato a cabeça
repouso e retorno
ao suspenso sussurro
de tua voz

keywords

por que não vem aquecer este fio de voz, esta promessa, o carmim que nos sustenta?

terça-feira, novembro 3

cinco horas

Tem que ser de porcelana branca, fina, com uma colher de chá pra tirar o amargo da tinta. Antes do primeiro sopro de voz, um gole pra adoçar, um diante do outro, antes de qualquer oi como vai. Deixará que ele explique esta esfinge de dois quando encostar a boca na borda do jogo. Vai descer lanhando queimando goela abaixo. Esse teu beijo expresso.

segunda-feira, novembro 2

P&B

por aí, com um balaço no peito sempre quando vinha aquela canção, tema deste nada, fundo musical possível pra uma cena que não saiu do script
às vezes procurou um grand finale com drops de anis e pipoca pra ver se sumia aquela imagem guardada
em você

rewind

Ok, você venceu, entendeu o recado no canto da página, este sangue que se coagula na grafia, pedindo tuas raspas teus restos o que falta falta falta o que se repete pra ter a tua pele na tela, este videodrama .
Encoste o teu rosto, a mão está aqui.

esquiva (um provérbio)

sim
é isca de pesca
escondida
pelo cúmplice
deste silêncio
mútuo

som
obscuro na boca
esperado
por aquilo que
seja bendito seja
você

quinta-feira, outubro 29

dolce

melhor como está
sem dor
ao menos uma
única
sem bis

assim fica
uma fratura
pra sempre
do meu no teu
sim

SOS

Sei por que se foge, tá na cara por que evita: as coisas ficam de pernas pro ar, bambas na corda caso o verbo seja conjugado. É por isso que escorre, abafa a respiração, entope a tela com o ausente. Cerca um canto no tempo pra tirar a cara de cena. Espera que se diga e mude o silêncio com uma simples frase que
eu sei, você sabe.

quarta-feira, outubro 28

aquele último

se ela se arranha toda assanhada, sussurrando sonhos de cio, se umedece a língua pra melhor lamber o arreganho da pele, é pra te ter melhor entre suas pernas, sua jaula

to bring you my love

tática

1- segure na mão sem querer
2- olhe firme
3- suspiro pra adoçar o peito
4- deixa sangrar

still

mesmo na distância
ainda que no fim do dia
você se derrete
sem eira nem beira
na espera do lá
com gravidade na voz
sem telefone
e tela de computador

pra que venha
sem alô por favor
antes que o desamparo
amanheça na cara

segunda-feira, outubro 26

ele e B. Dumont

Deixe o tempo passar pra ver se algo acontece.

Escreva e depois esqueça.

isso

Abre a necessaire e encontra os preservativos. Intactos. Cortesias de Zagreb: docinhos de borracha em papel dourado. O que te espanta é o português, o nome da marca: "amor".

ego

não, senhor das alturas
é desejo encarnado
o que te falo não dá conta
é pra você mas não entende

tuas manchas sujam
minha pele feito tinta

esse frescor

domingo, outubro 25

é pessoal

não é que não se pode tocar
é porque se desmancha
o teu mar
que ele sabe de coeur

reply

ainda mandando sinais de fumaça, pensando que as palavras giram em torno de você, uma frase e um tapa na cara, se escamoteia na ferida fingida e se esquiva

não faça a louca, baby: é teatro pro seu bem.

sábado, outubro 24

Babel

comunicação e experiência estética, saber envelhecer, a história definitiva de cinco ou seis anos de David, algumas das tantas verdades para Lisette, as primeiras estórias, a state of wonder enquanto la serpenta canta, um foco, ilustrações da moda de hoje
isso tudo com um pouco de felicidade,

grand finale

cordão se corta no ato
antes que seja o último
seco oco conciso
um soco sem risco
antes que seja armado
o cerco da palavra
de um desejo
há dois

sexta-feira, outubro 23

tour de force

Quase dormindo e você de Ray-Ban. Uma pantera na ressaca de um olhar 3x4. Convite para um passeio sem recusas. Boca cerrada, pontuação precisa. Mas o cabelo Farrah Fawcett não engana a gatunice. Um pires de leite não é suficiente para se desistir da ideia. Calçar as Ipanemas e ladroar palavras para a tua sopa de letrinhas. O que você deseja.

step by step

café, pão integral, meia fatia de presunto e mussarela, algumas páginas de cícero, risos com a amiga belga, cigarro varejo no fim de tarde, assalta tuas fotos no fim de semana, esta falta de merda do que ainda não teve, então quando?

quinta-feira, outubro 22

lista de cabeceira

Esperar aqui mesmo que você não apareça. Procurar o teu rastro, chegar rápido pra ver se te pega no flagra. Tomar banho bem cedo, perfumar as palavras e aquietar o coração. Fuçar as digitais de alguma ternura.

Rua do Ouvidor

Ele anda um pouco piedoso com as palavras, acarinhando de mansinho, botando os panos quentes sobre suas cabeças. Não consegue se dedicar no fundo, são volteios de língua sem embocadura do beijo. É bolor antigo cultivado em cada página. A única valsa que ele sabe dançar. Com você.

quarta-feira, outubro 21

dois pontos

só tem uma dor
uma única dor
só tem uma dor
uma única dor

um vulcão
transborda
o teu no
meu

vice-versa

você tem
aquilo
que quero:

você lê
aquilo
que quer

A no país do espelho

descobriu pelanca no final da polpa da bunda
o bloco do dente samba no céu da boca
respira fundo pra aguentar o trampo da carcaça
levanta ferro concentra forças e flexiona
espanta o medo do ser maravilha mulher

too day

Mais um dia com roupa lavada, estantes arrumadas e café no copo de geleia: as cuecas separadas da camiseta, o livro velho com o novo, duas colheres de açúcar no fundo. Tudo preto no branco.
O tédio dorme tarde com suas delícias.

terça-feira, outubro 20

duas horas

o quanto te consome aquela juventude declarada em cada letra sorridente menino
nos olhos despejada candura sem o rock'n'roll que consome sua fala
melhor se aquietar pra dizer tudo em resposta demorada e vazia
pra manter você por perto com olhar direto
como aquele devorando rastros grisalhos
noites néon teclas risadas idades sexo
mentiras compartilhadas

mistura e manda

de novo aquele mar que interroga imenso e não consegue tocar não se abre em dois pra sua banda passar
enxuga a mágoa e cuida bem de mim

último ato

a cada primavera
um jovem sacrifício
com o peso da promessa
poeiras de outrora

uma dia ele sangra um

quarteto

se ponto a liga b
atenção concentrada
cheiro de carícia
boteco e esquina

segunda-feira, outubro 19

os três cavalheiros

Pela manhã, ele imaginou como seria a queda: um pé do lado de fora e a inclinação do tronco. Sem motivo nem dores, somente a gravidade da ação, enigma puro. O depois dos que ficam e esquecem aquele que fechou os olhos pra esquecer, o amanhã como antes, nenhum alerta.
O que é bom, o que dura morto. E vivo.

Ícaro

André cansou da farsa de escrever. Agora busca algo mais longe dele, um conforto nas letras de esquina, sem volteios e suspeitas. Tudo por causa de um voo turbulento. Chega de cafés, cigarros e cascatas arremetidas.
Conseguir é uma dúvida.

domingo, outubro 18

panorama

o lilás da tarde em fim
sem mais sim do que não
a cidade na primeira vez
do oco vazio
dói só

terça-feira, outubro 13

segundo mandamento

ele fica mais e mais compulsivo na escrita pra ver se te alcança, já que fica impossibilitado do teu toque. talvez aqui neste campo minado ele te envolva numa prosa dissimulada, nas respostas que você sempre pode lhe dar, mesmo que de longe. ele sabe que você finje, olha para os lados pra ver se não vem alguém testemunhar o carinho furtivo que lhe dispensa. talvez aqui seja o límpido lugar dos desejos, da mais pura querença que os corpos limitam no oi dos dias úteis. um além, mas não engane a cilada: ele nunca foi você santo.

domingo

tá tudo cinza
sem tv e pipoca
notável silêncio
em língua empolada
telhado de vidro
de frases feitas
jardim do vizinho
pai de todos
sem bolo nem vela
tá tudo teu

quadrinha de roda

oferecer a cara sem dar as costas
abrigar no ninho outros tantos
que ainda suspiram por um dia
no regaço seu

sábado, outubro 10

a sentença da farsa

tomar conta daquele que te inunda o dia
com palavras de carinho e amor

quinta-feira, outubro 8

a quarta letra

ainda que não saiba quem é você, de qual nada você surgiu e o teu antes, ainda que não saiba o que faz sorrir teus dentes no gosto do olhar, a brancura atrás de um fundo brilhante, o que ninguém desconfia pra quem você fala, ainda que você leia e se surpreenda no final das contas com o débito de tua aparição imediata que sequer suspeita, ainda que você não imagina o sentido que te é dado num lance
o peito inflama:
ponta de agulha na ponta do dedo

quarta-feira, outubro 7

sesta

não venha você com canções e literatura
o mar verde de tua face já inunda qualquer palavra
insuportável no riso nervoso em convite
cadê boleros de esquina e revistas de quinta?
se a oferenda é presa voluntária
por que não mostra teu umbigo de carne?

graphein

se você disser que desafina as letras na tela, que tudo escorre no rodopio do teclado, que a música não trepa nem sai de cima da sua palavra, que as línguas estão mortas no entrelance do beijo, que lava as mãos limpas de tinta da vida,
se você disser que atenção pífia é querença na tua escrita
quem confia?

pancadão

ah, se eu fosse bandida e tivesse uma arma na mão eu dava um tiro na cara pra surgir a mascarada
porque eu tô toda me querendo

ritornelo

menos um dia
mais um passo mortal
atenção aos trapezistas
o sinal está verde
siga o sussurro siamês
olvida o contorno da orelha
sozinho no avanço
tudo é
questão
um state
of wonder

segunda-feira, outubro 5

falável

é um respiro vazio, quando não há mais nada lá, é com tanto amparo em vão, parece que combinou de vir com a camisa verde, agrisalhou um sorriso nos olhos, uma atenção espantalhada, você faz um gesto e você copia, meia volta volver se continua con su corazón, pare antes que tudo faça um sentido, agora

o salto do tigre

com outros foi feliz
mas não sabe ser
mulher

a mulher de Chopin

mesmo no cansaço, um tempo de algo sentir ainda que passageiro. saber a história de coeur não quer dizer que não haja surpresas quando lobo pega o atalho. abrem a porta e te pegam no nada mas que sabe lidar bem, por tantas desarmas. você não dá o início do jogo e retira as cartas da manga. pra não te machucar. poucas vezes solidário na dor.

quarta-feira, setembro 30

filme B

você sabe que assusta, não é fácil encarar uma fama de mau, sobrancelhas fechadas espantam, você também não facilita proximidades. tolice não ser o ninho de um estranho.

favor

se ele te beija o rosto, aperta o ombro e te olha nos olhos, por que não pergunta?

progressão aritmética

a cada dia que passa mais um fio branco desponta na cara e pele do peito. as noites não são mais dormidas e olhos sempre empapuçados. mais fácil ficar irritado e um grande exercício para evitar a complacência. voltou a gaguejar feito criança diante de um desejo muito forte, transpira debaixo do braço direito e o convite para o café na hora errada. e só tende a piorar.

quarta-feira, setembro 23

noturno

Se você estiver agora diante dele, saiba que seus olhos ardem, a mão repousa cansada e a brancura mais e mais profunda. Ele te olha sem medo e com um sorriso repleto de fado. Você, testemunha única desta fala seca de carne.

domingo, setembro 20

nova postagem

por que tantos versos de amor, tanta fala gasta, pura necrose de língua?
quantas voltas pra cair na mesma cilada de tantos.
letras que poderiam gotejar vermelho em cada fonema, no mais puro arlequim.
mas não são tantas assim que aparecem, é sempre a mesma
ciumenta e assassina palavra amada
amante

bilhete para o vidente

algum dia, quando passar a ser interessante pra qualquer um que você não conhece, quando abrirem os meandros e encontrar algo lá, mesmo que seja uma poeira no fundo do fundo. no dia em que deixar de pensar que existe alguém do lado de lá, que te espreita, te rejeita e te quer pra um café bem forte, sorvendo toda a tinta preta amarronzada. quando buscarem o teu nome no vazio da xícara.

sábado, setembro 19

a chave de casa

all this blues during the weekend
is just a little bit of mood
one for him
no one for you

quarta-feira, setembro 16

bio

writing
in another language
his foreign desire
just a possibility
to grasp
some unuttered piece
of him

segunda-feira, setembro 14

canto de página

teach me something wonderful

sexta-feira, setembro 11

Le Bouqueniste

ele ainda é do tipo que manda flores, mesmo sem querer. fica amargando este cadinho de terra alagada e coqueiro, inventa o seu próprio fado em plena madrugada murcha na falta de água fresca. não consegue regar delicadezas nem perfumes. prefere ficar sem fazer. sempre-viva.

quinta-feira, setembro 10

ante-sala

a tarefa dele de hoje é ficar com a alma bem quietinha, no mais puro silêncio branco. manter o olhar no horizonte e deixar o vento invadir na maior pieguice de imagens. não ficar lá nem cá, e isso não quer dizer que ele curta a corda bamba. não atender telefones, não responder emails. hoje ele quer viver no rascunho.

terça-feira, setembro 8

plié

Este teu indizível que não racha não acha o pouso,
no hay documento e nem abanicos do lenço
que acena a cortina que não desce sobre tua cara paisagem,
sobre o silêncio de todo rosto
qualquer.

domingo, setembro 6

uma cena

pensar no íntimo, em algo íntimo feito à distância, muito longe de qualquer um dos olhos.
ser um rei caolho num espaço longínquo.

uma outra cena

A cada letra
uma matança se dá
dedo após dedo
um é eliminado
e aparecem
cem outros tantos
até que um dia
se depare com
um um.

armário

veste a roupa do arlequim
o giro de trezentos e tantos graus
e mais um
losango colorido
galopa cavalo e sua língua
imaturo relincho
teu linho o meu ninho
e o resto é sombra de chão
em terra batida

segunda-feira, agosto 24

29/01/69

Te mando este pedaço de cidade, aqui não tem muita paisagem.
Sendo assim, espero que goste.
Do seu primo,

mate leão

descalça o rosto sem alarde
não percebe o avanço sorrateiro do inimigo
mergulha sem que o olhar impeça
o jogo que clama o dentro do aberto
derramando o chá das cinco
no pontapé da tua ferida

quinta-feira, agosto 20

rastro

essa é pra você
que tanto olha
e se interroga
pra que serve tudo isso
se o nada é a única coisa
que se guarda

an ordinary postcard

Recife, 28.02.78
Querido Paulinho,
só saudades,
recebi sua carta. Ainda não respondi por falta de tempo, mas breve o farei.
Enviei um cartão para Machado. Você sabe dizer se ele respondeu e recebeu?
Bem, mas este postalzinho é só para você saber que continuo me lembrando de você.
Quando você vai aparecer por aqui?
Do seu,

quarta-feira, agosto 19

esporro

o pai toca o filho no úmido meio
de sua pele imaculada
e procria desejo na prole
inútil
que olha o gozo
do filho do avô
tocado no úmido meio
de sua pele maculada
na trava da língua

R.S.V.P.

tem dias que ele sente uma solidão medonha: papo de bicho papão com a carochinha de que estar só é bom, de que a solidão é opção, coisa que não tem fuga e jeito de se lidar. preposição que se adianta e se posiciona no meio da fala. por que tanto coração na tua letra?

segunda-feira, agosto 10

o escudo do ladrão

um mundo pra ser tomado
enquanto a morte cai no blues
do teu Ray-Ban

sexta-feira, agosto 7

obras completas

sente saudade dos teus verdes encantos, interrogativos e pendentes no ar. bolero das antigas que só você sabe os passos muy bien. mas por que fica dançando a contrapelo enquanto a carne se envergonha de dizer que adora o melhor do lobo no homem?

obras completas II

é só chafurdar a sua biblioteca - o cheiro amarelado da herança dos dias, os livros não lidos, aqueles que foram assinados e jamais mencionados nas conversas, alguns que sequer saíram dos envelopes de papel, as pastas rosas de fotocópias, os cartões postais do mercado de pulgas, telefones dos amantes na última folha e que perderam o rosto do nome, dedicatórias formais e manchas de vinho na lombada, a enciclopédia do pai, receitas da mãe e revistas capricho.
tua estante é uma pose.

quinta-feira, agosto 6

fim de semana

esperar cansa, e causa uma dor maior ainda. você se coloca em posição de controle, se segura pra não ter um troço, mas o sangue fica a mil por hora e corre demais, a vida fica um pancadão. não tem banho de cheiro, não tem coqueiro e água fresca. tudo sai aos borbotões lá dentro, mas coloque uma represa, aprenda fazer muito barulho pra não ser pouco por nada. às vezes vem um cansaço. e um respiro. rouco.

sábado, agosto 1

la mancha blanca

jamais saberá como seria se tivesse nascido aqui. nunca pertencerá totalmente aqui, e onde nasceu não te quer mais. na realidade, nunca te quis -- é a mãe empurrando para o mundo um filho que busca a outra em casa postiça, e com quem finge brincar de experiência. não pertence a lugar nenhum, vive lá e cá, finge escolher, finge opções nas terras que são liberdades em você. o ledo engano da bolinha de pingue-pongue.

sexta-feira, julho 31

rascunho

deite aqui
a prata da casa
a mágoa da cama
ainda arrumada
deixe que
a voz rouca
do pai encontre
na boca rota
o pescoço filial:
ma chair e mon sang

segunda-feira, julho 27

acordar

na segunda com a ressaca de sexta
os desamores os mais cativos
e a chegada de mansinho
uma leitura de lábios
na carne muda
a contramão
do segredo
siamo qui

sábado, julho 25

chance meeting

quando pega assim com a mão cheia esse peso morto de macio volume em bruta carícia apertando e prestes a inflar em repouso as cavernas de carne agora exposta no repouso branco da tua úmida (por favor, um pouco de ar)

quinta-feira, julho 16

meia volta

podes conferir:
voltou com todo o mistério a vapor de louco, motivas de nada, projetos rococó com cantorias de galos barrocos.
podes ferir que ele gosta daqui:
a trilha de felina aberta.

green-eyed lacrimosas

ai, as tuas meninas ainda brincam de esconde-esconde na grama do teu que ainda tanto deseja

Rio Monte Video

você cola a face no livro e agradece o elogio. diz que ele também continua hermoso. ele ri já já já com a boca embolada em segredo de tâmara. você assinala novembro, no dia de São Tiago. no hay problema. quem ri agora é você que sabe de um tango que ainda dá samba que ninguém entende nem sabe dançar: este passo de dois.

quarta-feira, julho 15

&

pra você
o único que segue
a linha fraterna
sangue do sangue
dele
atado ao lácio
da letra em
flor
da língua
que beija
teu não
eu

moderato cantabile

ele se livra no silêncio, não responde, não dá as caras e a coragem fica beijando o chão, acaricia a indiferença com o sorriso branco de hálito puro que revela uma falha no meio da lente, enquanto não quer enxergar o fingimento de pura defesa rondando qualquer proximidade possível, evitando o devorar de garras e virar antepasto de tuas loucas delícias.
ele some te mata entre flores escapa
e respira

turning

então
ele reaparece sem a fina estampa das cartas, sem lenço nem documentos do lado de lá.
volta ladroando a tua vigília, mastiga um chiclete cinzento pensando no crime perfeito.
abre a porta da tua morada com a pergunta guardada trinta dias no pescoço.
ele responde
dois pontos

terça-feira, junho 16

Valentino

O desembrulhar quebradiço do celofane deslinda o belo ritual de frágil transparência. A língua se invade no rococó de tuas delícias anciãs. Noveau roman que nada, isso é caso antigo, ânsia de bem-querença cheia de não me toques porque senão eu morro de amor. Entre uma mão e outra um recheio de ar, róseo mal passado onde se quer ficar com os pés fincados. Dar a vida por este sonho
de valsa.

sexta-feira, junho 12

action movie

Um alívio saber que não está sendo seguido, que deixaram de buscar rastros - fuga adorável porque ele detesta o jogo de João e Maria, preferindo jogar pedrinhas no silêncio envidraçado. Tem horas que o sumiço infla os minutos com um prazer adorável e estranho. Ele relaxa, tira a roupa e toma uma ducha sem medo do fantasma de faca em punho. Um nada por

(o telefone toca o celular)

quarta-feira, junho 10

uma teoria

não venha com esta barba rala tapando buracos sem vergonhas
e esse curioso espanto das tuas coloridas meninas na grama
com a boca na botija do esconde-esconde a todo pique
um dia virá em que elas no castanho disfarce do teu rosto
darão um tropeço no picadinho de tua carne
e no preço da borda do desejo estampado
no meio do teu

REW

tanto tempo em pleno desaparecimento
mas agora retorna pra dar as caras e rasas falas

um savoir faire
pra salvar a sua fera

segunda-feira, junho 1

paisagem

como se não tivesse saído daqui
as mesmas vielas e o odor de patchouli
que acarinha o ferimento de dias sem suturas
a ladeira continua na sua dobra à esquerda
olhando de banda e música cheia
seus contos de areia inflados de mar
é água e passado
espocando chicote na
tua baía

quinta-feira, maio 28

está na hora

agora é o passo 36
mais 365 dias
se ele puder

um ponto

apagar tudo com todas as forças, não deixar vidas nem rastros, descer a borrasca lavando os passos, a mais pura vingança contra os dias, aniquilar cada grão e as suas poeiras, assentar um vazio e o deserto, um nada pra ninguém, rasurar sem olhar pra trás, extinguir com mais tinta, contaminar o fundo com o surdo eco
deste derrame

segunda-feira, maio 25

the after (e uma música ricercata)

ressaca de saudade é a pior que existe: amarga goela adentro e deixa maré nos olhos, vai e volta com toda a fúria tim tim por tim tim, assim infantil assim despretensiosa como a fala rocambole coberta de juras úmidas em máscaras nacaradas, onda devoradora arrebentando o peito e dedilhando momentos sem o agora pomposo e titânico
não é só você quem abre braços na proa da nau

domingo, maio 24

um simples

ele queria tanto ter você no eterno de cada dia, mas isso seria um religar e uma repulsa porque ele quer o mordiscado da vida que a hóstia evita.
ele queria teu perfume aos domingos para inudar a fala mansa dos olhos contornados em grafite porque você quer tua escrita no topo daquela pele inacabada.
ele queria
e você

II Ching

o azul do crepe saboroso em camisa chinesa
no quadrado vermelho transborda o saquê
e as perguntas que ele se faz em você
se os pensamentos te excitam as formas
irrigando as cavidades de tuas cavernas
você se obliqua e mostra as garras macias
que ele devora devora em tuas delícias
mas por que não se entrega?

concerto

voltar ao lar com a alva parte sob o tocar de sinos
dois cafés e um libreto dos olhares não prescritos
no hay culpa porque nós não trabalhamos com ela
as cordas em trio regem a dupla e um todo enlace
os afinos dos ouvidos na ciranda da última quadra
e retorna o tema da chegada de tua presença aqui
não tem um sofrer porque lá não se produz chagas
é só dor

segunda-feira, maio 18

fábula

Tem palavras que se transa com a boca: fissura rombo oco buraco ranho arreganho perna aberta e o que for de baixo calão. Parece que tem mais vida ali, naquelas aberturas em esfrega esfrega no cio do que no tempo que ele perde contigo.
Pois é: sem gasturas não existem ganhos.

na hora HH

agora
me fode com o céu azul
rápido

0800

Você já conseguiu olhar para o sexo dele sem culpa? Alguma vez percebeu o desejo em volume macio, repousado sob as roupas, sem qualquer soslaio? Tente imaginar o intumescente, sim, essa palavra luminosa que resplandece entre a carne das pernas, um delicado recheio que detém o silêncio dos teus olhos. Que te acometa a lascívia da água na boca vulgarizada, aberta para o deleite em jorro clandestino. O membro escorre, a língua escorre, as lágrimas escorrem.
Você transborda.

nada consta

ele vem publicando bem pouco de uns tempos pra cá, às vezes se pergunta qual a função de tanto escrever, e se descobre fraco, ainda derramando letras quando dá na teia, sem discplinas para surgir uma frequência de lápides e cristais da palavra, ainda muito verde muito romântico muito no campo das idéias ainda com acento, que poderia talvez aplacar em horas britânicas,

ele se pergunta porque continua esperando um comentário
seu

transa

Me torno o cavalo do teu santo dia e entorno o verde pasto profundo no dentro.
As letras dão pinote e rocamboleiam na reta do ar sobre cabeças feitas.
Corpo no tremular gozoso no suor risonho de tua homopietá
palavra boca a boca que nesse caderno não se possui nem reproduz
o estéril de todo o prazer.

terça-feira, maio 12

como era gostoso o meu

O que chama atenção é o teu antebraço sempre quando empunha a ponta da caneta. Os pelos escassos nas costas do pulso e distante das unhas quadradas. Mesmo não sabendo qual é a sua letra, as escritas no secreto do corpo sobre elas debruçado já promove um discurso de puro requinte. Não há como não se intumescer ao deixar o imaginário no caminho de tuas vergonhas.
Um só invadir.

N.T.

Porque o verde não se dissipa, por mais que não pronuncie a tua palavra. Um todo interrogativo pula e espoca no ar. É manteiga quente em pedaço de pão e vinho sorvendo teu suspiro.
Na conta da língua.

domingo, maio 10

conexo

Acabou de mandar um email e diz que se sente um patinho feio.
No meio de outros tantos.
Leste latino e américo sem o eu da roupa de tua europa.
Veio pra cá por causa de um espelho.
Avisei pra não vir. E nem pra te ver.

tram

qualquer comentário vira um zero
buraco fumaça halo branco
a minguada íngua da língua
ele não se sente estranho por lá
é tudo muito e um pouco nada
esquiva pontuda na letra da zebra
você se prepara porque ele vem pior
com um zero a mais na sinistra

Vrbik

a grama verde e alguma macedônia
onde o pingo do i tem a curva do j
e uma mentira
onde o feio mais belo é um cinza todo belo
de abertura santa
e uma falácia
o circunflexo caído
no meio de você

domingo, maio 3

unheimlich

tudo pronto para amanhã, da mais louca alegria
mas sem força recobrada na noite do leste onde
a bruxa desponta com os números do bilhete
da sorte grande.
ele aperta o sinto para a própria segurança
levanta a estima num vôo
antes que a asas derretam
sobre você.

sexta-feira, maio 1

(esta página fora arrancada)

os ossos retornam sem cerimônia após cinco anos sem as suas visitas, um todo clavícula que invade o quadro maior e maior quando a luz se abaixa, extendido no tempo sem pausa para o respiro de antes e que retoma o ontem de hoje, confusão espelhada em queda encenada
neste baú.

quarta-feira, abril 29

upside down

Quando acorda é uma lavação de roupa suja danada da vida.
Um tapa na cara do tédio em tarja preta uma relutância uma luta.
Hemorragia verbal pra ver se acaba de vez com toda essa ressaca.
Mas ele erra a mão.

terça-feira, abril 28

el regresso

Você volta, Morales.
Estacionamento livre.
Sem marcha ré.
Aceito tuas gorjetas.
E te dou a maior bandeira.
Dois.

tem algo queimando

Algumas vezes, quando percebe que existe um oculto, ele passa a borracha na mente, dispersa a legião que susssurra línguas e moralidades. Ele se espanta pois desta vez não houve o discurso da culpa. Manteve a calma corriqueira dos blasés, respostas claras de alma lavada. E chora por dentro. Só de relance.

segunda-feira, abril 27

palavras de um final de semana

quatro pilastras, sabor em companhia, o vinho pode ser encorpado, estampa de joaninha, estão olhando para o seu sexo, bolo de aniversário, microfone sem fio, óculos com lentes flutuantes, castelo branco, 2 é dialogo 7 é mistério, jaya mia, posso?, como a música é bela bartók, é mão sobre a outra, um café com stela artois no bar do leão, dark lines sob seus eyes, um duo a flanar na alma encantadora, a raspa do doce de coco, queimado corpo no frio da noite,
teu nome é pessoa.

person a

Ele cruzou uma fortaleza viçosa. Ficou na boca um sabor de cajú. Descobriu que olho não é carne, mas um possível silêncio. Em par.

quinta-feira, abril 23

caderno de caligrafia

As letras, agora, estão cada vez mais garrafais. Abandonou as curvas, a sensualidade das voltas sobre o papel, a aproximação da mão com o íntimo de um outro. É tudo direto, aberto na sua impessoalidade, sem os seus conhecidos hieroglifos. São caixas altas em berro, pedido de atenção e transparência. Sempre escreve assim quando se vê sozinho: ele se devassa.

quarta-feira, abril 22

alter-portrait

Ao esperar quem se ama, ele dorme com o peito em montanha russa. As horas engatinham dentro do estômago em rebuliço, mil e umas histórias pra ninar a noite. Pra de saudade não morrer.

self-portrait

Ao esperar uma resposta ele dorme com a pergunta, ruminante. Muitas vezes, passam-se duas horas até quedar o sono, falso. Fica como uma valsa renitente, música de comercial que gruda no céu da boca e só com aguarrás saem os resquícios. Daí surge uma outra pergunta: se ele não dorme por esperar um sinal ou pela morte iminente do ponto de interrogação.

rascunho rápido

ao menos uma rosa de dedos
uma reza no lance de dados
o fundo sobre a cabeça
aí tudo ficaria mais fácil
talvez uma penumbra
ele possa te revelar

segunda-feira, abril 20

Berlim Mitte

falar de você é sempre assim, lutar com as palavras
como que elas podem dar conta do contente em teus olhos?
onde, na errância da letra, possa o teu sorriso se fixar tal como ele invade?
o jeito que a tua presença se apossa não cabe aqui
está de forma outra, em calma saborosa
um silêncio de cigarra, surda melodia
um mantra do meu dia

domingo, abril 19

substantivo masculino

um fino aço em fio no estômago, um jato de ar, metálica gastura de gosto carcamano, saudosa ferida no salto da boca, radical lático da palavra do fundo, um sopro de lá
do seu

sexta-feira, abril 17

criptograma

, porque da dívida não se liberta. Coloca um Blazer da cor do ouro preto, come há oitenta anos atrasados. Se você ama, porque não se concentra em teu olho canibal?

quarta-feira, abril 15

confessional

Quem se apresenta por aqui?
Alguém se arrisca?
Os dados jogados e os lances permitidos.
Aquelas pronúncias de olho oblíquo.
Palavra pesada que sibila um olvido.
A língua vem de longe, em legião e muitos nomes.

les tropiques

a pele, a letra desferida em golpe de mestre que te joga do décimo primeiro andar adentro, bandeira dois que te encara de quatro, em queda livre do fundo no fundo derramando em todo o seu batman, querença de carne sugada no sobrevôo, um bocejo macio do coração pra você amassar

terça-feira, abril 14

Morales (DAF remix)

o frio te espera as ruas desertas os meninos do rock'n'roll limpando vidraças de carros o vinagre na comida da terra de nina cigarro de máquina nos euros da cara e pele palestina súbito banho de sol o muro caído a língua que arranha arranha e assanha
esta saudade que só te diz sim

contagem regressiva

esse cara tem a imagem contida
na cara alheia
você percebe a infantil mirada
que rouba e rouba
o salgado dos teus olhos

mas agora
deixa sangrar

segunda-feira, abril 13

passatempo

Ele reparava a nuca. Os pelos menos claros escondidos na camisa não incomodovam. Sequer percebia a vigilância cautelosa e dedicada. Ele deita em gramas suspiros polegadas dos olhos. Um rápido intervalo e um recheio desejado: morder teus fios filhos dourados de tua rija vergonha. Um dia, antes de ir.

com trato

o que os olhos não vêem, o coração desmente com toda galhardia
disfarça que desenxerga no cansaço, neste sorriso chiado
de pulga atrás da auréola

sábado, abril 11

noir

Pela terceira vez: é difícil viver nesta cidade. A cada passo, uma violência. Evidente que iria acontecer com ele um dia e não teria como fugir. Dobra-se a esquina e se desdobra o mesmo enredo do vizinho. A chegada de mansinho, a arma em punho, uma vítima indefesa. O nome foje e o santo não ajuda. Lá vem os sintomas: alerta, arrepio e barriga em frio. É rua sem saída e altas horas quando ele vê que são dois na espreita. É morte sem sentença e pernas bambas, ele vai dançar, não há como fugir daquele par.
De olhos.

rewind

Não sei se lembra daqueles que sempre estiveram por aqui. Muitas vezes ocultados, projetados no baço escuro, jamais esquecidos neste constante tatear. Sem queixume de outra cor e isso ele sabe de cor. É brilho pra dentro, de sorriso implodido. São azuis de encantos tamanhos. A tua traição.

o que é que tem

Tem o ouro pendente no azul, a sandália arrasta tuas ondinas, o sorriso arrega tuas narinas, as tuas meninas, a surda ressaca não pode falhar e que não pode falar.
Caia por cima de mim.

uma proposta

diga o que nunca diz, está tudo bem, faça afirmações com um sorriso, não ligue, turn off your mind, também pode, o furto do sono e suas terapias, você precisa, ele precisa, não se afete, entorne-se e chupe uma bala de menta. E minta.

easy listening

alguém na tua pele, este outro que te morde e aniquila o teu cheio. você quer se esvair em saliva, na sordidez de nomes e tuas reviravoltas, no alcance do fundo no fundo, acaso pontual, o perigozo compartilhado e teus erros.
mas quem você chama na hora H?

ele par lui-même

Ele come a letra desvio, instrumento do seu prazer, sem glória na completa escuridão, onde todo desejo boceja e se esquiva, apesar da língua rija que em sua boca não se torna carne macia.
Você me beija. Como se fosse dor.

quinta-feira, abril 9

a última canção

daqui ele não sai,
daqui ele não te mira

again

novamente vem você, irmão do morto, expirado no vácuo, o irrecuperável no dia de Pessach, que só se relembra pela falta
quais foram as suas palavras que ficaram para as testemunhas?
alguém te disse que a língua vem de longe?

o retorno

depois de tudo perdido, apagado no vácuo,
ele volta à sua escrita, com toda a revolta,
os olhos em faísca e a tela vazada.

não adianta apagar, André:
aqui se faz, ali se pega.